Monday, February 18, 2013

Resignação - Parte 2

Tudo o que eu queria te dizer, agora já não adianta mais. Já comecei pela escolha errada do metrô. Estou sentada. Esperando o trem no sentido errado. Totalmente oposto. Estou em Bank, estação que mais se anda e se perde tempo na vida. Perdi meu tempo. Perdi você. Pra sempre. Você se foi. Morreu. E o teu câncer foi o que te matou. Te consumiu. Eu, de você, não consumi nada. Só as migalhas. De um amor desiludido. Brincadeira. Falta de vergonha na cara. 

Os últimos dias no hospital foram os piores. Ver que tanta gente te visitava, mulheres aos montes. Todas elas no seu colo. Você lá, morrendo. Com o dreno debaixo dos lençóis, já que seu sistema não mais funcionava. Você não pensava em nada. Só processava o que comia, principalmente o que bebia. Elas lá. Aos montes. Se esbaldando e esbanjando com você. E você lá, morrendo. Sem reações. Confuso. Como sempre. Determinado, a se fechar e não depender de ninguém. Você que se achava tão forte, se definhou. E me deixou. Quantos anos da minha vida, me dediquei a você. Paguei suas contas, cuidei da sua família. E eu te esperei. Me juraste o amor eterno. Penso que este não existe mais.

Você se foi. Me deixou. Foi para uma melhor. Voltou para as suas origens espirituais. 
Queria morrer também. Me matar, ir com você. 
Mas você não deixou, não quis. Me privou de sentir. Não me permitiu tentar. Não quis ouvir. Não quis em mim acreditar. Morrer era mais seguro. E sei que aonde está, se sentirá mais feliz. Já conheceste o outro lado. Se cansou. Não quer isto. 
Quem sabe a gente não se encontra numa próxima reencarnação? Mas fique tranquilo. Não vou a pai de santo nem benzedeira, nem enviarei sinal de fumaça. Não faço estas coisas. Não mexo com isto. Tudo agora é pó. 

Daqui pra frente, me esquece. Como você nunca se lembrou. Permaneço como sempre fui para você - mesmo depois de 46 anos juntos - um mero acontecimento. Um erro. Um divertimento. Para se esquecer do mundo quando ele era insuportável para você. Quando a realidade te pegou. E você com este câncer de próstata ficou. Desenvolveu. E eu quis tanto cuidar de você. Ser a sua verdadeira mulher, mas você nunca quis. Preferiu se entregar ao câncer. Pois este iria te machucar. Até a morte. Era mais seguro se entregar a morte, do que a vida presente e ser feliz. 

Eu agora sigo. Sozinha. Sem você e o seu câncer, que você tanto quis cultivar por falta de coragem de reconhecer a vida dentro de você. E viver. Não sei porque, mas o câncer te confortava, te deixava feliz. E isto, eu nunca saberei porquê. Era mais seguro se entregar ao que era certo. A morte.

Já estávamos em quartos separados, camas de solteiro. Não entendia. Nos últimos dias você dizia que sozinho estaria, e que comigo não dormiria. 
Por amor eu aceitei, por amor fiquei calada, e você se aproveitou, e "aproveitou-se" com outras tantas. Aquelas "elas" das quais eu nunca soube e ainda mais agora, nunca saberei. Você foi covarde. Desistiu. Não tentou.

Agora com 86 anos, ainda me lembro bem. Quase metade da minha vida perdida com você e o pouco que me resta - mais do que tudo - quero viver.

Sunday, February 17, 2013

Rita

A Rita foi ao sex shop... Ai ai ai. E gostou. Bastante. E lá encontrou de tudo, e de todos os tamanhos, formas, cheiros, gostos e cores. 

O pessoal lá da vizinhança acha que a Rita é "santinha", que "paga uma de moça boa e de bons costumes". Em parte sim, todas as suas contas, pagas em dia. Até a do cartão de crédito. 

Leva flores para o túmulo da avó do vizinho, ajuda a passar a roupa da tia e vez ou outra, limpa até o apartamento da amiga que quase não pára (ou passa) por lá. 

Moça direita (mas que vota para a esquerda), vive a vida decentemente (tem horas que até demais!) e já há muito tempo, não se entrega ou se delicia nos prazeres afetuosos da carne. 

Não sente o gozo, a chama ou a saliva. A boca está seca, e assim, "Toma água minha filha"! 

Se permite pensar. 
Ah, e isto Rita faz, e muito. 
A imaginação, ah, esta sim, corre solta. Pensa de um tudo e em todos. Desta, ninguém escapa. 

Saturday, February 16, 2013

Vespúcia


Foi lá da janela mesmo.
Estava cansada.
Teve uma semana muito estressante.

Sacou o vibra e “pimba”! E este foi bem na gorduchinha mesmo, pois Vespúcia pesava 180kg.

Lá de fora, os caras jogavam pedrinhas na janela dela. Só pra provocar. Ainda mais.

Ela deixa o incenso queimando, e com isso, também queima as suas vontades mais reprimidas. Com tanta gordura pelo corpo, o rosto cheio de espinhas (mesmo já beirando os quarenta...), ela se sente incapaz de atrair o sexo oposto.

Seus únicos amantes são a geladeira, o vibrador e o chocolate. O antes, o durante e o depois.

Fica ali, quietinha, em silêncio. Não quer que os vizinhos a ouçam, já que quando caminha, as patas de elefante fazem aquele imenso barulho pela casa de dois andares, dividida com mais três famílias.

Fica ali, sentada. Se masturba com o vibrador, que desaparece, no meio de tanta pelanca e aquela massa de gordura.

Se esquece. Do mundo real, já que aquele eh o único momento que tem pra si. Já que é só.
Em poucos minutos, uma mistura de sensações e sentimentos vem a tona. Mexe a cabeça. Levemente. Em um balanço leve e tranquilo. De um lado para o outro. As borboletas passam pelo estômago gordo e sobem até o pescoço, dando aquela sensação de coceirinha gostosa que sobe um pouquinho mais e a fazem viajar. Por dimensões que só ela conhece e gosta de explorar. Do jeito dela. Descobre mundos e cores psicodélicos, doces, irradiantes, excitantes, gostosos, íntimos, cheio de luz, de alegria, e um pouco daquela perversão. Mas contida, tímida.

Não conta pra ninguém. Viaja sozinha. E assim estará.

Thursday, January 10, 2013

Alguém

"Alguém... Who wants to be (literally!) all over me." Era o que Janete pensava.

"Alguém que queira estar comigo, mas não aquele esquema 24/7 grudento, ciumento.  Pequeno. Mas ao mesmo tempo, ter sim alguém, que sinta falta do meu cheiro, do meu corpo quente e do meu pé gelado. Da meia furada e do travesseiro babado. Das noites intensas de amor fervente e avançado e dos momentos tranqüilos e desacelerados.  Que queira sentir o meu toque singelo, das palavras sussurradas ao pé do ouvido". É assim o pensamento de Janete, que, lá quase chegando aos 40, dizem que é a idade da loba mas, ela parece não estar esperando feliz por este momento...!

"Quero alguém pra dividir, alegrias, tristeza, e por que não, na saúde e na doença? Eu também quero sentir isto", pensa ela com o anel de ouro, dado pelo ex marido. 

Acredita ela que nestes longos anos de "solteirice" (não por opção), que tenha talvez aprendido a lidar e ver a vida de uma forma diferente (nem sempre!) e viver / ser mais independente. Se decepcionar, sim, ficar triste e até cair na "fossinha básica" (ninguém é de ferro né gente!) mas ao mesmo tempo colocar em ação o difícil exercício de não querer se enfraquecer com as relações mal sucedidas, que não levariam para lugar algum ou que não tivessem nenhum futuro ou possibilidade de ir pra frente. Sair fora, antes que se machuque mais ainda e que estrague ainda mais o seu coraçãozinho.

Cansada daquele "papinho", de sou bonita, inteligente, descolada, mas "não estou pronto para você neste momento, me desculpe"; e em poucos meses está feliz da vida com outra, e até hoje. Janete já não aceita mais. 

"Sabe de uma coisa?", disse ela,  "Cansei de ser mulher ponte. De ficar recolhendo "caquinhos" de homens mal resolvidos "provindos" de relações destruídas. De fortalece-los e depois levar um pé na bunda, mas daqueles assim com a botina bem lustrada e caprichada".

Não precisa ter um currículo perfeito, impecável; até porque perfeito, ninguém é. Não precisa falar seis diferentes línguas, carro na garagem, barco a vela esperando na marina, nem ser "cheio da grana". Não precisa ser PhD em Física ou Diplomata, nem puro de coração e sentimentos. Mas que a ame. Intensamente. E que com ela, só ela, queira estar, nos poucos momentos que estiverem juntos. E que não pense em ninguém nem nada. Só naquele instante. 

(Coitada da Janete, mesmo não acreditando mais em príncipe encantado, acha que o sapo ainda pode ser resgatado...)

Janete cansou de ser mulher independente. É óbvio, não quer ser dona de casa "full time", mas quer um companheiro, um homem, alguém que mesmo com bagagem (filhos, gato, cachorro e papagaio), esteja ali com ela e para ela, e que não traga os fantasmas do passado e o porta-malas cheio (com toda a mudança "de mala e cuia") de sentimentos pesados consigo, mas que esteja livre para um momento diferente, para novas experiências. 

Que o peso não esteja em suas costas, nem nas costas de ninguém. A gente não merece sofrer o sofrimento dos outros. A gente ajuda a se reerguer, mas precisamos de um colo também. Mulher maravilha, é só aquela dos quadrinhos do gibi meu bem.

Janete está aberta. Para tudo e para todos. E com esta abertura vêm as críticas. E que elas venham; pois somos diferentes, com um conceito diferente de vida, educação, crescimento e evolução. 
Experiências. Cada um vive a sua e sente do seu jeito. Imerso. Reflexivo. Distante. Pensante.  

Assim ela se expressa. Escreve. Nem sempre o que todo mundo gosta ou queira ouvir. Até porque "quem conta um conto, aumenta um ponto", e não se sabe até que ponto, se tudo isto é verdade.  

Até enquanto este momento não chega, ela espera. Sentada. E aberta, pra receber e consolar os companheiros de guerra. Dispostos e abertos para tentar e vencer a luta. Sem derramar sangue, é claro. 

Sunday, January 6, 2013

A história do chiclete

Sentimentos.
Assim como a dor de dente e de barriga, são as pessoas em nossa vida; elas vão e vem.

Tem vezes que dói bastante, incomoda. Parece que não vai passar. Às vezes nem tomando remédio ajuda. É tentar não pensar. É desviar o pensamento. Dar a atenção para situações, coisas, momentos que te deixam alegre.

Eu falo. O que sinto. De uma forma e um jeito diferente talvez. Tem gente que não gosta...
Bem... Paciência...
Esta, muitas vezes eu também tenho de ter.
Paciência é uma arte. E a gente solta o lado artista de vez em quando.

De bailarina, pra dar piruetas e correr do que acontece. Malabarista, para equilibrar as situações e não se desestabilizar. Palhaço, para muitas vezes rir para não chorar.

Paciência é assim, acontece com muitos de nós. Às vezes fica curtinha, mas depois ela volta ao normal. Passa.  Que nem a dor de dente. E a saudade. Ela passa também.

A saudade é como um chiclete.
Mas não como aqueles chicletes grudentos, chatos, que você mastiga um pouco, não gosta do sabor e logo quer jogar fora.

A saudade é como aquele chiclete Bubbaloo sabor de melancia (se não gostar, escolha aquele que prefere). É nostalgia boa, e você nunca vai se esquecer dos momentos bons que viveu. Nunca perde o gosto!

Acho que me desacostumei um pouco. De tantas "indas e vindas". Tanta gente passando, entrando e saindo do meu caminho, da minha vida. E é assim. A gente segue. Mas não esquece.