Resignação

Ei. Respira. Senta. Vamos conversar.
É. Sim. Sobre nosso casamento.
Veja por onde e para onde estamos indo.
Você na Austrália e eu na Itália.
A nossa filha crescendo.
Ela com três e já falando quatro línguas.
Que ela faça tudo o que não fizemos.
Que ela dê a volta ao mundo em 365 dias quando tiver 15 anos e aproveite cada canto desse planeta.
Que não seja imprudente como nós dois, que engravidamos e hoje vivemos angustiados, com trabalhos exaustantes e mesmo assim, estamos distantes.
Um do outro. Eu de você. Você de mim.
Já não fazemos mais parte do íntimo de cada um. Me recolho. Não tenho mais idéias.
Estou seca. Desidratada. Cansada. Alcoólatra. Fumando dois maços de cigarro por dia. Um para mim e outro pra você.
Esfrego o último Marlboro no cinzeiro e olho para fora. Não consigo confortar o mundo.
Sem você. O céu está azul. As aves voam… Lá em cima. Mas a janela com as barras de aço me mantém segura. Por não ter você.
Me sinto velha e desesperada, por não ter realizado 5% dos meus sonhos de adolescentes que nunca desfrutarão do sentimento de ser real.
Não suporto. Me corto. Dói. Na carne. Dói. Na alma.
Não aguento. Não posso mais ouvir aquele CD da Cássia Eller que me faz lembrar de você todinha. Em mim.

É angustiante e me sufoca.
Eu parto.
Me mato.
Adeus.